Cidade
“Projeto reafirma cultura machista”, diz pedagoga
Para presidente do Instituto Cores, proibição de educação sexual reforça estereótipos que são a raiz da violência doméstica
Presidente do Instituto Cores, uma organização sócio-educativa que tem como principal objetivo promover a Educação Sexual em diferentes setores, a pedagoga Caroline Arcari classifica o projeto de lei municipal que veda disciplinas sobre orientação sexual de “lamentável”. “É um enorme desserviço à educação, feito por pessoas que pensam que entendem sobre sexualidade, gênero e currículo”, contesta.
Segundo Caroline, a diretriz proposta pelo vereador Fábio Velozo nega o direito fundamental à proteção da criança e do adolescente garantido pelo ECA. “Digo proteção porque trabalho com prevenção de violência na esfera familiar e afirmo que a raiz da violência doméstica está nesses estereótipos de gênero que reforçamos todos os dias na nossa cultura.”
Para a educadora, o modelo atual, que ensina os meninos a serem “durões” e as meninas a brincar de boneca, reproduz a cultura da violência. “Quando dizemos ‘segurem suas cabritas que meu bode está solto’, estamos ensinando aos meninos que estão autorizados a se relacionarem com agressividade, se comportarem como animais, usando coação, violência e não se importarem com consentimento.”
“No Brasil 1 mulher é estuprada a cada 11 minutos e essa lei quer bloquear qualquer projeto que discuta esse tipo de tema? Não me espanta o fato de ter sido proposta por um homem”, aponta. De acordo com ela, falar sobre gênero é colocar em discussão os papéis atribuídos para meninos e meninas, homens e mulheres, a fim de diminuir problemas sociais a partir da proposta de uma sociedade mais justa e com maior equidade entre os gêneros.
‘Família tradicional’
Na análise da educadora, que é gestora da Escola de Ser – um projeto social com 11 prêmios nacionais e 1 internacional em excelência de educação integral e boas práticas de prevenção de violência – o discurso típico de preservação dos valores da família tradicional parece ignorar que, de modo geral, as famílias são violentas e abusadoras. “Em um mundo no qual 2 em 5 crianças são abusadas sexualmente e, dessas, 85% dos abusos ocorrem dentro da família, está difícil entender que tipo de valores precisam ser preservados.”
Caroline explica que trabalha os assuntos gênero e orientação sexual semanalmente no currículo dos seus alunos. “Diferentemente dessa lei, respeitamos não só o ECA, mas a Declaração dos Direitos Humanos. “Vamos continuar falando sobre isso e vamos incomodar muito, porque nossa metodologia já chegou em 4 países além do Brasil.” Na opinião dela, caso aprovado, o projeto pode colocar o município entre os mais atrasados em termos de direitos humanos e educação.